segunda-feira, março 12, 2012

Efeito de ricochete

O Presidente da República é um referencial simbólico do regime e um recurso de enorme valor para o sistema. Do método de eleição aos poderes que, de facto, pode mobilizar, tudo converge para que Belém seja uma válvula de escape, um factor de estabilização e um solucionador de última instância. O que se espera de quem ocupa transitoriamente o cargo é que consolide e reforce a natureza da instituição.
Independentemente de sabermos a quem devemos atribuir o pecado original de "deslealdade institucional", o texto ontem conhecido de Cavaco Silva não tem a elevação que se espera de um Presidente em exercício. Para além de reconhecer a sua própria impotência, revela um assinalável ressentimento com Sócrates, pessoalizando uma questão que se esperava fosse institucional. Esta fixação com o ex-PM tem, aliás, o condão de lhe atribuir um nível de responsabilidades que, a ser verdadeiro, deveria ter levado a que a mudança de líder do executivo tivesse resolvido o essencial dos nossos problemas. Como sabemos, isso não aconteceu.
Acima de tudo, o texto não pode deixar de produzir um efeito de ricochete. Quando mais precisávamos de alguém capaz de unir o país e ajudar a superar a crise existente – e outras situações mais dramáticas que podem bem vir a surgir –, temos um Presidente que se autolimita, divide e revela, mais uma vez, um tipo de preocupações desadequadas ao cargo.

comentário ao prefácio de Cavaco Silva publicado no Expresso